quarta-feira, 25 de junho de 2014

A poética dos sentidos


Cesário verde (1855 - 1886) não viveu o tempo suficiente para nos deixar uma obra literária abundante. Contudo, a sua poesia representou as preocupações de um certo modo de vida finissecular. Consciente do vazio mental que o país padecia, o poeta nunca se alheou do espaço vital em que se movimentou. Há em Cesário Verde uma construção poética, que assenta na expressão viva e colorida duma realidade por vezes cruel, que se fixa principalmente nos sentidos:
Bóiam aromas, fumos de cozinha;
Com o cabaz às costas, e vergando,
Sobem padeiros, claros de farinha;
E às portas, uma ou outra campainha
Toca, frenética, de vez em quando. “
Ele é o poeta do OLHAR, que deambula pela cidade e capta o instante, como se de uma máquina fotográfica se tratasse; retrata e retrata-se nela, registando a medida exata das coisas e das pessoas, sem preocupações metafísicas, que possam atribuir conotações de natureza subjetiva, ou que transfigurem a realidade nua e crua.( Caeiro, mais tarde, haveria de lhe seguir os intentos). Nos seus poemas tudo aparece limpo e transparente. O poeta incorpora-se na matéria como se dela fizesse parte, todos os sentidos são epidérmicos e completam um mosaico de sons, luzes, cheiros, coisas do mundo que o OLHAR, a cada passo, vai  reinventando. Estamos no domínio de uma linguagem que serve de ponte para a sua poesia, e que, simultaneamente celebra um pacto com a vida.

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